Dr. João Gabriel Duarte comenta sobre a técnica da estabilização da tutela antecipada

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A inovadora técnica da estabilização da tutela antecipada e os comandos antecipatórios faticamente irreversíveis

Dando continuidade à onda de reformas do Código de Processo Civil, surge o projeto de lei elaborado pelos processualistas Ada Pelegrini Grinover, Kazuo Watanabe, José Roberto dos Santos Bedaque e Luiz Guilherme Marinoni, que, buscando alterar a estrutura legal da técnica antecipatória, propõe a estabilização de seus comandos, tornando-os definitivos e acobertados pela intangibilidade própria da coisa julgada. Em síntese, o projeto defende que, uma vez deferida a tutela antecipada, incidentalmente ou em procedimento prévio, e se omitindo as partes quanto ao prosseguimento do processo ou à propositura da demanda cognitiva, a decisão transitará em julgado. A idéia apóia-se, pois, na possibilidade de se afastar o ônus da parte de ajuizar outra ação na qual não possui interesse, conformando-se com a eficácia da decisão concedida de forma antecipada. Assim, se estaria conferindo efetividade ao sistema, considerando a diminuição do número de demandas e o aumento do tempo para julgamento das questões realmente relevantes e necessárias.

Como é sabido, o objetivo concreto visado pela tutela antecipatória nos moldes atuais é a imediata eliminação provisória da situação de perigo ou de injustiça que a manutenção do estado fático das partes representa para o direito subjetivo material do autor. O provimento antecipatório, que, em regra, se confunde com aquele conferido pela tutela principal, gera a satisfação antecipada da pretensão substancial. Contudo, trata-se de satisfatividade provisória, possibilitando o retorno das partes ao estado anterior no qual se encontravam.

Ocorre que, existem situações extremas em que se observa a satisfatividade irreversível da tutela antecipada, vez que, nesses casos essa é a única forma de se assegurar a efetividade do processo. Em razão da natureza da situação de direito material, a antecipação acaba gerando efeitos irreversíveis, tornando completamente desnecessário o provimento final. A irreversibilidade dos efeitos da tutela final concedidos antecipadamente representa, dessa forma, medida destinada a garantir a efetividade do processo, dotando-o de utilidade e eficiência.

Pensemos, por exemplo, nos litígios que envolvem planos de saúde, nos quais a seguradora se nega a cobrir as despesas hospitalares em razão do tipo de doença; a falta de autorização para realização de necessária transfusão de sangue; a autorização para que o filho viaje com um dos cônjuges contra a vontade do outro; a autorização para realização de aborto de feto anencefálico, entre outros casos. Em todos eles, o julgador se depara com uma delicada situação, porquanto para que possa preservar o direito deduzido pelo autor terá que sacrificar os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa. Nesses casos, a única forma de se evitar o perecimento do direito e assegurar a efetividade do processo é antecipar irreversivelmente os efeitos da tutela, já que se assim não fosse estaríamos diante de uma inutilizada prestação jurisdicional. A crise existente na esfera do direito material, nessas situações, encerra-se com a concessão da medida urgente, prosseguindo o processo unicamente em razão da técnica processual.

O modelo processual hoje existente exige que mesmo nesses casos haja o desenvolvimento regular da marcha processual, chegando-se a final a uma sentença de mérito destituída de nenhuma utilidade prática. O prosseguimento do processo justifica-se unicamente pra que os efeitos dos provimentos irreversíveis antecipados adquiram a necessária legitimação jurídica. Aqui, vislumbra-se uma importante contribuição da estabilização da tutela antecipatória, na medida em que impede o prosseguimento, ou instauração, de demandas manifestamente inúteis.

A técnica da estabilização, nesse contexto, poderá dotar de efetividade o processo. Isso porque, elimina a necessidade de prosseguimento, ou ajuizamento, da demanda principal de mérito. O provimento de natureza antecipatória e irreversível elimina, por si só, a crise do direito material, dando pronta e definitiva solução às crises urgentes, não podendo, em razão da impossibilidade fática, retornarem às partes ao estado anterior no qual se encontravam. Sem prejuízo dos demais benéficos efeitos trazidos pela técnica da estabilização, é sobre esta qualidade de litígios que sua atuação poderá ser mais eficaz.

Fonte: HTJ advogados

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