Dra. Ester Norato comenta algumas diretrizes do Novo Código de Processo Civil

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Breves apontamentos sobre as diretrizes do Novo Código de Processo Civil: a celeridade e a conciliação na perspectiva da efetividade da prestação jurisdicional

Ester Camila Gomes Norato Rezende

O Direito Processual Civil brasileiro tem vivenciado a partir da década de 1990 numerosas alterações pontuais, com o propósito voltado à promoção de maior efetividade da prestação jurisdicional, conferindo ao jurisdicionado resposta em tempo razoável de sua pretensão deduzida em juízo.

Essa efervescência das reformas, algumas delas incidentes sobre questões basilares da ciência processual, conduziu o legislador nacional a cogitar da promulgação de novo Código de Processo Civil, onde se pretende que os estudos processuais contemporâneos – tendentes à maior conformação às premissas constitucionais, sobretudo às tônicas de efetividade e instrumentalidade do processo – ganhem sede. O Senado Federal instituiu, em 02 de outubro de 2009, comissão composta por alguns renomados processualistas com o desiderato maior de conferir a devida sistematização ao processo civil nacional, aos olhos de muitos prejudicada com as variadas reformas legislativas empreendidas até então.

Em dezembro de 2009, a aludida comissão trouxe ao conhecimento da comunidade jurídica e da sociedade brasileira em geral as proposições que orientarão o desenvolvimento do novo Código de Processo Civil.

Na nota que acompanhou a exposição das proposições, o Ministro Luiz Fux asseverou que “a ideologia norteadora dos trabalhos da Comissão foi a de conferir maior celeridade à prestação da justiça”. Tal assertiva deve ser compreendida com reservas.

Já é corriqueiro afirmar – mas não demasiado repetir – que o desiderato maior não deve ser a simples celeridade, que, por vezes, pode implicar sacrifícios inaceitáveis à segurança jurídica ínsita ao Estado de Direito. Deve-se visar, sim, à efetividade da prestação jurisdicional, a qual intenta conciliar em justa medida a resposta célere do Estado sem prejuízo às garantias constitucionais do devido processo legal, notadamente o contraditório e a ampla defesa. Com efeito, não se pode compreender a ideologia apontada pela Comissão responsável pela redação de proposta de novo Código de Processo Civil como propósito de celeridade a qualquer custo. O mote, pois, deve ser a efetividade e não apenas a celeridade.

Forte na proposição de assegurar a prestação jurisdicional em tempo razoável, como preconiza a Constituição da República no art. 5º, LXXVIII, os membros da Comissão apontaram, a título de proposição a constar no livro relativo ao Processo de Conhecimento, “a criação de um procedimento único bifásico, iniciado pela audiência de conciliação”.

É sabido que a idéia de um procedimento único e invariável para as mais vastas espécies de pretensões de direito material foi corroborado pelo Código de 1973, cuja especial atenção foi dedicada ao procedimento ordinário. Todavia, as reformas que se ultimaram até então primaram pela consagração da denominada tutela diferenciada, que visa romper com o mito da ordinariedade que norteia o processo de conhecimento como originalmente concebido pela processualística tradicional. Caracteriza, dessa feita, o reconhecimento de que o instrumento empregado para a solução de conflitos de interesses deve ser adequado a cada espécie de conflito levada à apreciação do Judiciário, visto que assim agindo potencializa-se a efetividade do processo.

Nessa ordem de idéias, a proposição de criação de “um procedimento único bifásico”, o qual sempre contará com audiência de conciliação, também deve ser compreendida com reservas. Não se pode olvidar que as pretensões de direito material são variadas, muitas não se aliando a um procedimento ordinário, padronizado. De mais a mais, muito embora a solução conciliatória seja de grande valia, há que se reconhecer que existem casos onde não existe espaço para esta solução, sendo despicienda e dispendiosa audiência para esse fim.

Acrescente-se, ainda, que a obrigatoriedade de tentativa de conciliação somente será exitosa sob a ótica da efetividade, se o magistrado a quem compete sua condução estiver verdadeiramente preparado para este fim, sendo conhecedor de técnicas próprias para esse expediente e hábil a colocá-las em prática, sob pena de constituir essa determinação do futuro código mais um formalismo inócuo.

Cumpre destacar, nesse ponto, a proposta lançada pela comissão de “ampliação dos poderes do magistrado, como, por exemplo, adequar as fases e atos processuais às especificidades do conflito, de modo a conferir maior efetividade à tutela do bem jurídico, respeitando-se o contraditório e a ampla defesa”.

Muitas outras são as proposições que merecem reflexão da comunidade jurídica. O intento de promulgação de novo Código de Processo Civil é oportunidade salutar para revisitação das bases dessa ciência, a fim de verdadeiramente reformulá-la e adequá-las às suas novas necessidades. A mesma concepção dos institutos basilares do processo civil, que guiou o legislador de 1973, notadamente voltada à solução de conflitos individuais, não se mostra suficiente à solução das lides massificadas e à imperativa celeridade que marcam a sociedade contemporânea. Entende-se, então, imperativo repensá-los, a fim de que as determinações do direito positivo sejam tecnicamente alinhadas em seus fundamentos teóricos.

Acredita-se que o esmero da técnica corroborará o desiderato de efetividade da prestação jurisdicional, concorrendo para a justa realização do direito material.

O que se busca combater é o tecnicismo e o formalismo exacerbado, que perniciosamente conduzem à visão do processo como fim em si mesmo. Malgrado essa equivocada perspectiva, a boa técnica é aliada do processo, é dizer, a adequada disciplina dos atos processuais e seu correto emprego ensejam a realização dos desígnios para os quais o processo é instituído, qual seja, a pacificação de litígios e a harmonização social mediante a efetivação do direito material, em atenção, ademais, aos ditames constitucionais voltados à efetividade.

Fonte: HTJ advogados

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