Dra. Laura Sarti comenta sobre a Lei 12.744/2012, que acrescentou à Lei de Locações o art. 54-A.

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A Lei 12.744/2012 acrescentou à Lei de Locações o art. 54-A, o qual dispõe que:

Art. 54-A. Na locação não residencial de imóvel urbano na qual o locador procede à prévia aquisição, construção ou substancial reforma, por si mesmo ou por terceiros, do imóvel então especificado pelo pretendente à locação, a fim de que seja a este locado por prazo determinado, prevalecerão as condições livremente pactuadas no contrato respectivo e as disposições procedimentais previstas nesta Lei.

§ 1º – Poderá ser convencionada a renúncia ao direito de revisão do valor dos aluguéis durante o prazo de vigência do contrato de locação.

§ 2º – Em caso de denúncia antecipada do vínculo locatício pelo locatário, compromete-se este a cumprir a multa convencionada, que não excederá, porém, a soma dos valores dos aluguéis a receber até o termo final da locação.

§ 3º – (VETADO).

Esse dispositivo normatiza na legislação brasileira um modelo contratual atípico há muito já utilizado e que, portanto, vem sendo objeto de análise tanto pela doutrina, quanto pela jurisprudência pátrias.

O contrato “built to suit” – chamado por alguns doutrinadores de “locação por encomenda” – é um negócio jurídico complexo por meio do qual o locador, às suas expensas, adquire ou constrói um imóvel que deve atender às finalidades e necessidades específicas do locador que, em contrapartida, obriga-se a locar o referido imóvel por prazo determinado. Via de regra, a locação será de longo prazo e o preço dos aluguéis será mais elevado, de forma a possibilitar, assim, que o locador obtenha o retorno do investimento feito.

Trata-se de uma alternativa negocial interessante para aqueles que, a despeito de precisarem de um imóvel com características específicas, não querem mobilizar o seu capital na aquisição desse bem. Também para o empreendedor (locatário) há uma evidente vantagem, qual seja, a garantia da locação e, via de consequência, a certeza de percepção de aluguéis pelo prazo necessário ao retorno do investimento feito.

Diante dessa busca pelo retorno do capital investido, foi defendido na doutrina, na jurisprudência e até mesmo em projeto de lei (Projeto de Lei 6.562/09) a impossibilidade de submeter esse tipo de contrato a uma ação revisional de aluguéis, ao fundamento de que eventual redução do aluguel poderia romper com a equação econômica do contrato. Entretanto, o §1º do art. 54-A, cujo texto foi incluído na Lei de Locações pela Lei 12.744/2012, veio para encerrar essa discussão. Ora, se a lei estabelece que “poderá ser convencionada a renúncia ao direito de revisão do valor dos aluguéis durante o prazo de vigência do contrato de locação” é porque a regra – até mesmo em virtude da força cogente da disposição contida no art. 45 da Lei 8.245/91 – é de que a revisão dos aluguéis é permitida.

As particularidades dessa modalidade contratual, em especial o fato de o locador custear a construção ou aquisição do imóvel, não desnaturam a essência da relação negocial locatícia estabelecida entre as partes. No contrato “built to suit” a despeito das suas nuances, estão presentes os elementos “cessão do uso e gozo”, “remuneração pela cessão concedida”, “coisa não-fungível”, “tempo determinado”, “não transferência da propriedade”, característicos dos contratos de locação.

Com efeito, não é a forma ou a intenção com a qual o proprietário adquire o imóvel a ser cedido em locação que define o tipo contratual. A busca pelo retorno do investimento não é capaz de afastar as normas cogentes e princípios gerais: boa-fé, equilíbrio econômico, vedação da onerosidade superveniente. Com isso, mesmo sendo o contrato qualificado como “built-to-suit”, não é possível afastar a aplicabilidade do regime geral das locações, menos ainda os princípios gerais do direito.

O aluguel mensal, independentemente da sua forma de composição (componente fixo, componente fixo mais variável) tem como objetivo a busca pelo retorno do investimento no prazo contratado mais a remuneração pelo aluguel propriamente dito. Nesse contexto, se por qualquer razão, a forma de composição do aluguel mensal não remunerar com justiça o locador de forma que ele receba pela aluguel do imóvel, no mínimo, o valor de mercado, será plenamente legítimo o pedido de revisão dos aluguéis.

Não há dúvidas de que nessa modalidade contratual devem prevalecer as condições livremente pactuadas entre as partes. Todavia, como bem assentado no novo dispositivo legal, não ficarão afastadas “as disposições procedimentais previstas nesta Lei”. Donde ser induvidoso o cabimento das ações locatícias, inclusive a revisional e a renovatória.

A normatização da modalidade contratual “built to suit” – a qual já define algumas questões bastante controvertidas na doutrina e jurisprudência, como o cabimento de ação revisional de aluguéis em relação a esse tipo de contrato, certamente contribuirá para disseminar, ainda mais, essa prática negocial, já que começa-se a traçar balizas mais específicas e seguras sobre a sua regulamentação. Todavia, em função da complexidade desse tipo de contrato e da ampla liberdade das partes na pactuação das suas cláusulas, muito ainda haverá que ser analisado e decidido à luz dos casos concretos.

Fonte: HTJ advogados

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