Dra. Natália Lima comenta sobre o fracionamento do objeto licitado

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O artigo 23, § 1º da Lei n.º 8.666/93 e a questão do fracionamento do objeto licitado: dever ou juízo discricionário da Administração?

Questão tormentosa e que tem suscitado controvérsia nos tribunais diz respeito ao suposto dever da Administração de proceder ao fracionamento de obras e serviços licitados, em face do que dispõe o artigo 23, §1º da Lei nº. 8.666/93. Com efeito, estabelece o dispositivo, ‘in verbis’:

“As obras, serviços e compras efetuadas pela Administração serão divididas em tantas parcelas quantas se comprovarem técnica e economicamente viáveis, procedendo-se à licitação com vistas ao melhor aproveitamento dos recursos disponíveis no mercado e à ampliação da competitividade sem perda da economia de escala”.

Diante do comando legal, a dúvida que tem surgido é a seguinte: havendo possibilidade de fracionamento do objeto licitado, é possível a licitação em bloco único, ou a Administração terá, sempre, o dever de realizar a concorrência em parcelas?

De fato, o legislador estabeleceu o fracionamento como regra a ser seguida pela Administração. Todavia, existem limites legais a serem observados. O fracionamento será sim obrigatório quando restar comprovada a sua viabilidade técnica e econômica, ou seja, quando de sua adoção resultarem vantagens efetivas para a Administração.

Neste contexto, é a própria lei que sinaliza a necessidade de se analisar cada caso, pois nem sempre a possibilidade de fracionamento implicará em vantagens para a Administração e para a coletividade. Há serviços e obras que, uma vez fracionados, podem ter sua qualidade e eficiência comprometidas. O fracionamento pode resultar, não raras vezes, em ineficiência do serviço e em aumento de custos para a Administração, especialmente com gastos periféricos, como os gastos com controle, logística e gerenciamento de determinados serviços.

Não é o simples fato de ser possível o fracionamento que enseja a sua observância pela Administração. O que define a sua prevalência é o interesse público, consubstanciado na comprovação efetiva de vantagem oriunda do fracionamento, seja em termos de eficiência e qualidade do serviço, seja em função da redução de custos para a Administração.

Portanto, não se pode afirmar que a norma em voga encerra um comando ao qual o Administrador está absolutamente atrelado, sem margem a qualquer juízo de discricionariedade. Pelo contrário. Demonstrada a inviabilidade técnica e os prejuízos econômicos acarretados pelo fracionamento, é dever da Administração optar pela licitação em bloco único, em observância ao princípio da eficiência e da economicidade.

Ademais, casos haverá em que a necessidade de preservação da unidade será mais relevante e determinante do que o próprio preço. Em outras palavras, a economia financeira ou o aumento da concorrência não podem justificar a adoção do fracionamento quando, na prática, isso possa resultar em ineficiência na prestação do serviço e em riscos para o administrado.

Em qualquer das hipóteses, a motivação do ato administrativo é de fundamental importância. Quer a Administração decida pela licitação em bloco único, quer decida pelo fracionamento, tal decisão deverá ser sempre motivada e escorada nas vantagens obtidas em cada caso.

Desta feita, não há como negar que a questão reside sim, ainda que com balizas, no âmbito da discricionariedade da Administração. Não a discricionariedade total, irrestrita, mas a discricionariedade motivada e fundamentada caso a caso. À Administração cabe demonstrar as razões técnicas e econômicas que revelam as vantagens ou desvantagens do fracionamento. E nem sempre a vantagem econômica será determinante. A economia aparente da Administração não pode se dar à custa de um serviço mal executado, pois nem sempre uma proposta mais barata resultará na prestação de um serviço eficiente.

Em suma, o dever da Administração, encerrado no artigo 23, §1º da Lei nº. 8.666/93, consiste em realizar a licitação da forma mais vantajosa possível, considerados os ganhos técnicos e econômicos advindos da opção pelo fracionamento ou pela licitação em bloco único. A adoção de um ou outro meio terá sempre em vista o interesse público, finalidade última e valor consagrado pela norma em análise.

Fonte: HTJ advogados

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